sexta-feira, 20 de julho de 2012

Parteiras Urbanas

Parteiras urbanas
Cada vez mais mulheres trocam a segurança do hospital pelo aconchego do lar na hora de ter bebê. Não à toa, surge uma nova leva de parteiras, que são enfermeiras especializadas e atuam em grandes cidades
texto: Danae Stephan 
fotos: Egberto Nogueira

No Brasil, país onde são realizadas por ano 1,2 milhão de cesarianas, 40% dos nascimentos - e esse índice chega a 90% em certos hospitais particulares -, conseguir um parto normal já é uma vitória. Mas para algumas mulheres isso não basta. Elas querem ter filho fora do hospital, em local acolhedor, onde o ritmo do seu corpo seja respeitado. E sem procedimentos médicos como jejum, lavagem intestinal, soro ou episiotomia, corte lateral na vagina feito em 70% a 80% dos partos normais, embora se recomende não passar dos 20%, por risco de complicações para a mãe. Interessadas em resgatar o que parece ser mais natural, essas mulheres preferem dar à luz no aconchego do lar ou em casas de parto, onde são atendidas por uma parteira. Nada a ver com aquela figura tradicional, que atua basicamente em regiões inóspitas, com pouquíssima estrutura, cobrindo o buraco da falta de médicos e hospitais. As novas parteiras urbanas são enfermeiras especializadas, ou obstetrizes, e acreditam no que chamam de 'parto humanizado'.
E o que é exatamente isso? 'É a execução de um conjunto de normas recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que visa melhores resultados para a mãe e para o bebê', resume o diretor técnico do Hospital Geral Santa Marcelina do Itaim Paulista, em São Paulo, Marcos Ymayo. Entre as várias recomendações da OMS estão respeitar o local selecionado pela mãe para o nascimento do seu bebê, dar liberdade de escolha da posição do parto e não usar rotineiramente a episiotomia. Para Suely Carvalho, coordenadora da organização não-governamental Cais do Parto, de Recife, parto humanizado é aquele que envolve muito pouca ou nenhuma intervenção (anestesia, por exemplo, nem pensar) e no qual a mulher pode manter o tempo todo o controle do nascimento.
'Decisões como dar à luz de cócoras ou na água e por quanto tempo ficar com o bebê no colo após seu nascimento deveriam sempre ser tomadas pela gestante, não por médicos ou enfermeiras', reforça Ana Cris Duarte, criadora do site www.amigasdoparto.com.br. Um parto humanizado envolve ainda a presença do companheiro - ou de alguém da família -, um direito garantido pelo Ministério da Saúde desde 2004 em todo o território nacional. Em nascimentos fora do hospital, procura-se respeitar tudo isso.
Em países como Holanda, Japão e Suécia, os partos domiciliares ultrapassam os 30% do total. Na Itália, esta é uma opção oferecida à futura mamãe já na primeira consulta do pré-natal. No Brasil, não há sequer números confiáveis para medir a quantidade de parteiras em atividade. 'O último levantamento oficial foi feito há 14 anos e não contemplava as regiões Sul e Sudeste', diz Suely. Na época, foram contadas 60 mil parteiras. Em outras palavras, o movimento pró-parto humanizado por aqui ainda é incipiente. Mas já dá sinais de que veio para ficar. Há hoje no país cerca de meia dúzia de casas de parto - duas em São Paulo, uma no Rio de Janeiro, duas em Minas Gerais e uma no Ceará. Até a prestigiada Universidade de São Paulo (USP) criou o curso de obstetriz na unidade da Zona Leste, para formar profissionais preparados técnica e psicologicamente.
'Foi uma grande sacada da USP. A demanda por esses profissionais só tende a crescer, em virtude da pressão de mulheres que querem voltar a ser donas do processo do parto', diz o obstetra Jorge Kuhn, professor da Universidade Federal de São Paulo, ele próprio um 'parteiro urbano', já que vai em domicílios paulistanos trazer bebês ao mundo. Verdade: cada vez mais gestantes lutam para ter um parto normal e fora do hospital. 'As mulheres que me procuram precisam batalhar pelo que querem, ir atrás de informações por conta própria', diz Vilma Nishi, parteira em ação na capital paulista.
A produtora cultural pernambucana Maria Vasconcelos de Oliveira realmente teve de nadar contra a corrente. Quando engravidou, aos 40 anos, ela foi pressionada durante os nove meses para marcar cesariana. 'Não sabia nada sobre gravidez, mas as informações médicas que recebia não batiam com as mensagens do meu corpo', conta. 'Eu não estava doente e nunca pensei em ter meu bebê em hospital.' Ao conhecer a Cais do Parto, conseguiu informações suficentes para ter certeza de que daria à luz em casa. Com a ajuda de Suely, Clara, hoje com um ano e meio, nasceu com 3 quilos e 52 centímetros, sem complicações ou sustos.




Enfermeira Obstetra Rosimeire em atendimento domiciliar à gestante Diane Medeiros (dez 2011)

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